Texto de Luana Bonone, presidenta da Associação Nacional dos Pós-graduandos (ANPG), enviado ao JC Email.
O Brasil alcançou no ano passado o 13º no ranking
de produção científica. Trata-se de uma conquista meritória, digna de
elogios. Entretanto, a demanda de desenvolvimento do país exige uma
agenda de diversificação dos modelos de pós-graduação e das modalidades
de bolsa no país, assim como na própria formação escolar. Os
pós-graduandos brasileiros têm algumas propostas que buscam dialogar com
o momento de efervescência em termos de políticas de educação e ciência
e tecnologia que vive o país.
O Brasil nos rankings científicos
O Brasil é hoje o 13º país em termos de produção científica no mundo.
Tal posição foi conquistada por meio da implementação de políticas
importantes para o desenvolvimento da nossa pós-graduação, como o
próprio processo de expansão do número de programas, de discentes, de
docentes e de bolsas de pesquisa (acompanhando o processo de expansão
das universidades federais), assim como um importante esforço de abrir
as universidades brasileiras para um virtuoso processo de
internacionalização. Embora haja um debate importante sobre o nível de
produtivismos exigido de docentes e discentes, há que se ressaltar que
os mecanismos de avaliação da pós-graduação também jogam um papel
importante neste processo, até pela centralidade que a pesquisa assume
nos cursos de pós-graduação brasileiros.
Tal mérito não deve ser desconsiderado ou menosprezado como um
resultado meramente estatístico. Trata-se de uma conquista importante a
um país que busca se posicionar de forma estratégica no cenário
internacional. Entretanto, a demanda de desenvolvimento das forças
produtivas e também a urgente necessidade de desenvolvimento social do
país impõem uma agenda de aceleração deste processo de expansão da
educação superior e de reavaliação dos próprios modelos de educação e de
formação de recursos humanos na pós-graduação. A palavra de ordem deve
ser diversificação, na pós-graduação e também na escola, embora a forma
deva ser diferente nos dois casos.
Diversificar a formação de recursos humanos
A pesquisa de base é fundamental para o desenvolvimento de qualquer
projeto e deve ser valorizada, mas a universidade precisa fornecer muito
mais do que pesquisadores acadêmicos e professores universitários à
sociedade: nossa pós-graduação precisa formar gestores públicos,
pesquisadores capazes de atuar no setor produtivo, educadores preparados
para a realidade concreta das escolas e universidades brasileiras,
profissionais qualificados/especializados nas mais diversas áreas e uma
infinidade de outros perfis que dêem conta de participar da consecução
de um projeto de nação democrática e soberana.
Tal objetivo pode ser cumprido com medidas como a diversificação da
formação na pós-graduação (por meio de mestrados profissionais,
especializações, mestrados e doutorados sanduíche ou doutorados plenos
no exterior, como faz o ousado Programa Ciência Sem Fronteiras, entre
outros). Redefinir o papel dos Institutos de Pesquisa também é uma
medida importante, como vem debatendo o MCTI. Tais medidas apontam um
caminho importante que vem sendo trilhado pelas instituições de
C,T&I no país.
Mas o Estado ainda precisa conseguir promover políticas de integração
do próprio setor produtivo com a pesquisa, um grande desafio a ser
enfrentado e cujas melhores respostas até agora vêm das incubadoras de
empresas inovadoras e parques tecnológicos. Acredito, ainda, que um
mesmo programa de pós-graduação pode ser capaz de formar perfis
diferenciados de pesquisadores e profissionais e, sem dúvida, a
diversificação das modalidades de bolsas de pós-graduação também pode
ser uma resposta interessante a essa demanda.
É neste contexto que vem sendo debatida e maturada nos debates entre
os pós-graduandos brasileiros a ideia da diversificação de modalidades
de bolsas. Uma proposta que venho apresentando em espaços como os
encontros preparatórios para o Fórum Mundial de Ciência é a ideia de uma
modalidade de bolsa de pós-graduação e financiamento de projetos
voltados à extensão em programas de mestrado e doutorado.
Durante toda a década de 1990 e início dos anos 2000 a extensão foi
pouco ou nada valorizada dentro das universidades públicas e
praticamente inexistente nas instituições privadas. Ocorre que a
extensão é justamente a prática voltada a implementar junto à sociedade o
conhecimento produzido dentro dos altíssimos muros que cercam a
Academia. Trata-se da aplicação deste conhecimento por meio de projetos
que, muitas vezes, interferem em realidades locais. Apenas no último
período tal assunto voltou a ganhar relevo, por interesse do ministério
da Educação e convencimento da própria presidente Dilma Rousseff. A
pós-graduação deve jogar um papel importante neste sentido, visto que a
prática da extensão pode ser uma forma revolucionária de promover a
divulgação científica no Brasil (na prática).
Bolsa tutoria
Um exemplo concreto é a proposta apresentada pela ANPG e muito bem
recebida pelo Ministro Aloizio Mercadante de implementação de uma bolsa
tutoria, cujo objetivo é promover o processo de melhor integração dos
estudantes que entram na universidade com o novo ambiente de
aprendizado, promovendo até mesmo uma espécie de nivelamento quando se
fizer necessário. Tal debate foi estimulado pela mais importante ação de
democratização do acesso à universidade desta década que foi a
aprovação da Lei da Reserva de Vagas nas universidades públicas,
defendida pelas entidades do movimento educacional há décadas, tendo
como primeira propositora a União Brasileira dos Estudantes
Secundaristas (UBES).
Os chamados estudantes cotistas já provaram ser aqueles com as
melhores médias nas universidades em que ingressam, entretanto, a
qualidade da educação básica no país ainda precisa avançar muito e no
processo de implementação de uma nova política de tão grande vulto, é
prudente pensar ações que visem dar todo o suporte a este novo público
que finalmente terá acesso à universidade pública no Brasil. Isso vai
desde políticas de assistência estudantil até o necessário apoio
acadêmico, como é a proposta da bolsa de tutoria, onde pós-graduandos
fariam uma espécie de estágio-docência que, agregado às atividades de
pesquisa que desenvolve no seu programa, justificariam uma nova
modalidade de bolsa; e os estudantes de graduação que assim desejassem
cumpririam atividades ministradas por esses pós-graduandos no intuito de
serem inseridos ao processo de aprendizado e desenvolvimento de
conhecimento que marcam a vida universitária, em grupo sempre coordenado
por um professor-pesquisador.
Educação científica na escola
A experiência da extensão poderia contribuir, ainda, para uma das
diretrizes previstas no Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG
2011-2020), de engajar os programas de pós-graduação brasileiros na
melhoria da educação básica no país.
O investimento nas escolas brasileiras é urgente e a demanda
grandiosa. Uma contribuição que venho apresentando nas reuniões junto à
Capes e ao CNPq é a proposta de aproveitarmos melhor os equipamentos
públicos de Ciência e Tecnologia existente no país para incrementar a
qualidade da educação básica. Isso pode ser feito por meio da associação
de institutos de pesquisa com instituições educacionais de ensino
básico, como é o caso do Instituto de Ciência e Tecnologia Renato
Archer, em Campinas, que se prepara para abrigar um Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo em suas dependências . A
ANPG é uma entusiasta do projeto e foi convidada a participar dos
debates que darão origem ao projeto pedagógico desta ousada empreitada.
Apresentamos, ainda, como proposta, a utilização dos espaços de
museus, bibliotecas, planetários, observatórios e outros equipamentos
públicos, em geral sub-utilizados, para aulas práticas a turmas da
educação básica, o que poderia ser feito no contra-turno, aproximando
nossas escolas do objetivo apresentado pela presidenta Dilma de
implementar a educação integral e, ao mesmo tempo, promovendo a educação
científica como um elemento importante que pode agregar qualidade à
educação básica no Brasil. A escola brasileira deveria oferecer aulas
nesses espaços e também nos equipamentos públicos de esporte e cultura
existentes, aumentando a utilização de tais equipamentos e promovendo
uma vivência diferenciada do(a) estudante, o que poderia ajudar
inclusive no processo do jovem se identificar mais com a escola, um
importante fator de evasão no ensino médio.
Tal ação poderia ser implementada também por projetos de extensão que
ainda agregassem metodologias, estudos sobre currículo e
desenvolvimento psicológicos e social de criança e jovens e curso, de
forma que a aplicação da pesquisa retornasse como uma contribuição da
pós-graduação brasileira de forma efetiva à melhoria da nossa escola.
Se o desenvolvimento que buscamos é para dar impulso aos inúmeros
potenciais ainda não revelados do continente chamado Brasil, então a
aposta na diversificação é uma aposta na maior riqueza que possuímos, o
nosso povo. Apenas agregando conhecimento e método à já rica sabedoria e
criatividade do povo brasileiro conseguiremos encontrar algumas das
respostas que o país procura no rumo de um desenvolvimento que seja para
melhorar a vida das pessoas. E precisamos descobrir nossa própria
maneira de fazer isso, sem modelos pré-fabricados ou pacotes de medidas
pasteurizados e embalados para consumo. A resposta para o nosso
desenvolvimento está na nossa própria constituição enquanto nação e é na
superação dos gargalos históricos que encontraremos o rumo mais justo.
Fonte:
JC e-mail 4626, de 20 de Novembro de 2012. |
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